8.3.06

Vates II ou A Febre e Os Caças Asa-X

Dizem que há um lado bom e outro ruim para tudo. Acho que isto depende tremendamente de perspectiva, e até onde me consta, todas as coisas que possuem apenas dois lados foram feitas pelo homem (folhas de papel, moedas, mesas, religiões maniqueístas...), em sua desesperada busca por simplicidade e segurança. O leitor já viu uma árvore ou uma pedra com frente e verso? É, achei que não.

Então, não tentarei fazer uma separação clara entre os lados bons e ruins da doença, mas digo: adorei ter caído de febre no carnaval. Não sou grande fã do mesmo, e raras vezes extraé tanto prazer de simplesmente ficar em casa sem me levantar muito da cama; sentindo aquela dor leve nos músculos, o peso nas juntas, a tonteira ao mover-se mais rápido, a sensação indescritível do banho, a água quente escorrendo pelas costas. O tempo livre sem peso na consciência, livre para os carinhos de uma moça adorável que aceitou perder seu feriado tomando conta deste imprestável, livre para fitar o teto de seu colo, e pensar simplesmente.

Os pensamentos dado momento voltaram ao término do assunto que eu iniciei aqui de outra feita, ao que eu então citei e a partir do qual pretendia elaborar.

"Pelo feliz, ela tb nada demais faz: pessoas felizes têm a vida naturalmente repleta de poesia e podem, facilmente, criá-la, se acharem que precisam de mais, ou que sua felicidade deveria ser partilhada da melhor forma possível."

Lembrei disto quando Cristóvam obrigou-me a admitir meu estado emocional, e me peguei pensando que, ora vejam, sentia-me genuinamente feliz, e que agora é que estas palavras faziam mais sentido do que nunca: vejam, o vazio de posts deste blog! Comparem-no com os momentos de crise em seu início e a enxurrada de artigos de então. E ainda assim eu tenho escrito mais poemas do que jamais escrevi antes, guardo no coração tanta inspiração que sinto que poderia preencher o mundo com ela - mas não necessito, nem quero fazê-lo. Guardo-a para mim, e para aqueles com quem desejo compartilhá-la, o que quase sempre tem significado somente uma pessoa. Como o personagem de Douglas Adams (que certamente não foi o primeiro a dizê-lo), prefiro estar feliz a estar certo; e no fundo, todos preferimos: apenas alguns acham que a felicidade maior é estar certo. E não sei se todas as pessoas que julgam estar felizes, ou ter tido uma vida, ao menos no geral, feliz, assim como eu, não têm a menor necessidade de sair espalhando palavras por aí - preferem criar para si mesmas, ou para poucos. É a dor que cria o desejo de ser ouvido, de provocar reações.

Simplismo, simplismo bruto: minha filosofia é agora bilateral como a folha de papel e boa parte das criações humanas. Não há vidas felizes, nem infelizes: o prazer é esta coisa fugaz que nos acomete e acelera a percepção da passagem do tempo até que, invariavelmente, a dor cobra seu preço por ele; o senso de realização não escapa ao temor da ruína; a possibilidade de perda acompanha o ganho. A felicidade não dura, não pode durar por definição, é temporal como o que quer que ocorra no mundo, coisa "transitória e fugidia que pisca como vagalumes e se desfaz em pó e frieza." Pode-se estar feliz, nunca o ser (mas pode-se fingir).

Por isso não julgo estranho que boa parte dos grandes vates fosse um bando de fodidos: é muito mais fácil espalhar a palavra diante da necessidade gritante de ser ouvido, muito mais fácil fugir para a arte quando não se tem muito mais para onde correr e, principalmente, muito mais fácil se foder. Não creio que alguém que nunca tenha estado feliz e infeliz seja capaz de criar, mas tampouco creio que seja possível viver sem passar por ambos; o que resulta como arte a partir disto, varia com o tempo e as circunstâncias, estas coisinhas teimosas que tanto interferem em nossas vidas, e permitem que os vates narrem, cantem, pintem as felicidades e infelicidades, seja na tentativa vã de fuga, de buscar a eternidade, ou qualquer outro motivo humano e inerentemente estúpido - e tudo isto terá sido resultado do risco que correram.

E eu? Não gosto de riscos. Como já disse antes, entre o conforto do meu quarto e o cockpit de um radiante caça asa-x, provavelmente ficaria no meu quarto, ainda que febril: sentindo aquela dor leve nos músculos, o peso nas juntas, a tonteira ao mover-me para longe da cama, a sensação indescritível do banho, a água quente escorrendo pelas costas; fitando o teto enquanto Carla enrola os dedos pelos meus cabelos.

Não gosto de riscos, mas, leitor - não concebo risco maior que este.

6.3.06

Erro 143

Post feito com login de usuário errado (tb conhecido como erro do blogueiro estúpido). Vou deixar este aki pra não jogar fora os comments de vcs, tá? Tá. Mas os comments referem-se ao post acima, que é do Alessandro, ok? Alessandro.