31.3.05

Condicionamento

É impressionante como o ser humano é uma coisa falha.

Hoje deixei a chave da minha sala em casa e vim com a chave dos fundos de casa no bolso. Não sou um sujeito atrapalhado ou esquecido - ao menos não com chaves; toda minha vida, fiz isso uma vez. Contando com essa de hoje.

Questão de condicionamento, como dirigir o carro, escrever ou falar. O corpo vai se acostumando e você para de pensar e só age intuitivamente - é uma coisa tão eficaz que existem correntes filosóficas inteiras baseadas nisso; "união da mente e do corpo", "quando se deixa de pensar em um gesto, alcançou-se a perfeição do ato". O problema com a prática: o hábito desleal de matar a teoria. Troca-se um par de chaves e um postulado-chave do zen-budismo vai pro caralho, o esquecer volta a ser só esquecer e nada de perfeição, o confie em seus instintos, Luke, modificado para confie em seus instintos, mas com moderação, Luke. Na dúvida, mande a mira automática te dar um toque.

Ou enfim, talvez a perfeição até exista, só não sei como ter certeza de alcançá-la. Daqui de minha limitada visão de mortal - particularmente a do mortal trancado do lado de fora de sua sala de trabalho, mais particularmente ainda do mortal também sem seus livros - cada gesto, por mais condicionado, treinado e preciso, vai ser sempre como um lance de moeda a la david hume: hoje cara, amanhã... vai saber. Pelo menos minha vida não costuma estar frequentemente sob alto risco.

Lembra-me aquele caubói da piada. Você sabe, atira, assopra, atira, assopra, atira, assopra, assopra...